Conheça a PEC 241/16

A PEC do “ajuste fiscal” e a soberania nacional

Marcia Abreu*

PEC do fim do mundo. PEC da doença e da ignorância. PEC do mal.

Muitas são as adjetivações, mais ainda as incertezas e rupturas nas políticas sociais.

O governo interino encaminhou ao Congresso Nacional, no dia 15 de junho, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241/2016, que pretende “instituir o novo regime fiscal”, no Ato das disposições transitórias da Constituição Federal. 

A proposta pretende definir um novo teto para o gasto público, adotando como limite a despesa executada do ano anterior, corrigida apenas pela inflação. E adota a mesma regra para os investimentos em educação e saúde, importantes setores que contam com vinculações orçamentárias definidas explicitamente na Constituição.

Os investimentos sociais serão congelados em termos reais, passando a ser corrigidos apenas pela inflação.

Muito importante lembrar que as vinculações constitucionais para saúde e educação foram definidas em função do reconhecimento da importância destes dois setores para a vida da população. E concretizaram-se após muitos anos de luta de toda a sociedade brasileira.

Para a educação, a Constituição Federal estabelece que “a União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino”.

Na saúde, a Emenda Constitucional 86, promulgada em março de 2015, fixou para a União um investimento progressivo de 13,2% da receita corrente líquida em 2016, 13,7% em 2017, 14,1% em 2018, 14,5% em 2019, e 15% em 2020. Já os municípios devem investir 15% de sua receita e os estados 12%.

Uma retrospectiva histórica demonstra que o setor de saúde conseguiu ver expressa a necessidade de uma vinculação orçamentária somente na Constituição Cidadã de 1988. Vindo a ser concretizada em percentuais específicos apenas em 2015, conforme demonstrado acima.

Com muita gravidade, observamos que na área da educação contamos, com algum tipo de vinculação orçamentária na Constituição, desde 1934!!! Ironicamente, as exceções à esta regra deram-se em 1937, no governo Vargas, e em 1964, na ditadura militar. E, justamente agora o governo interino apresenta esta proposta.

A PEC prevê o congelamento dos gastos públicos pelo período de 20 anos, admitindo sua reavaliação somente a partir do décimo ano. Para 2017, se for aprovada, o limite de gastos será a despesa primária realizada no exercício de 2016, reajustada pela variação do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Nos exercícios posteriores, corresponde ao limite do ano anterior, corrigido pelo IPCA. A proposta de teto refere-se às despesas primárias, ou seja, exclui o pagamento dos juros e da dívida pública. E, nestes 20 anos, a prioridade será justamente este pagamento.

A justificativa da PEC alega que o problema fiscal do Governo Federal está no crescimento acelerado da despesa pública primária. Ou seja, atribuem os problemas aos investimentos sociais com saúde, educação, despesas com servidores públicos, políticas sociais afirmativas e de promoção da dignidade.

Ato contínuo, atribui as penalidades de eventual extrapolamento do teto não ao governante, mas aos servidores e serviços públicos.

As penalidades englobam a proibição de concessão de qualquer tipo de reajuste aos servidores públicos, a criação de cargos, alteração de estrutura de carreira, contratação de pessoal e a realização de concursos públicos, admitida apenas reposição por vacância.

Ora, se a PEC for aprovada, da forma como está, significará a redução do Estado diante das necessidades da população. Na contramão de todos os avanços auferidos no último período.

Por mais de 3 anos, foi discutida e aprovada a vinculação de recursos da educação ao PIB, no percentual de 10%, e definidas metas ambiciosas, mas factíveis, para o Plano Nacional de educação. E na saúde, por longos anos, foi discutida a necessidade de definição de percentuais específicos nos investimentos para a área, finalmente conquistados, de forma progressiva, a partir de 2015.

Em caso de aprovação desta PEC, a tendência é de descumprimento de todos os planos estabelecidos para as áreas da saúde, da educação e demais políticas públicas. A redução dos investimentos em proporção ao PIB será brutal. E a trajetória de inclusão social, de acesso aos bens e serviços públicos será interrompida tragicamente.

O economista João Sicsú fez um estudo comparando os investimentos efetivamente realizados no período de 2006 a 2015, diante da proposta apresentada.

Tomemos 2015 como exemplo.  Se a proposta tivesse sido aplicada ao SUS desde 2006, isto é, somar ao gasto do ano anterior apenas a inflação medida pelo IPCA e depois ir somando a inflação dos anos seguintes, em 2015, o governo federal teria gasto 65,2 bilhões e não os 102,1 bilhões que, efetivamente, gastou. Ou seja, o SUS teria quase a metade do recurso federal e atendido muito menos em 2015.

Aplicando-se a mesma lógica à educação, o governo federal teria gasto 31,5 bilhões e não os 103,8 bilhões que gastou, ou seja, a educação teria menos de um terço do recurso federal e realizado muito menos em 2015, da educação infantil à superior.

Importante atentar que os investimentos em políticas públicas têm um efeito dinamizador da economia além, é claro, do seu caráter emancipatório. Estima-se que cada 1% do PIB investido em educação e saúde resulte em quase o dobro em expansão na economia.

Com a justificativa de necessidade atual de ajuste fiscal, o governo interino pretende fixar uma regra para 20 anos!

A receita é a mesma de todos os governos neoliberais. Sempre que se fala em cortes, os alvos são os trabalhadores, os servidores e os serviços públicos, as políticas de benefícios destinadas à população, especialmente nas áreas sociais.

Com isto, simplesmente ignora as enormes necessidades de investimentos que ainda urge na população, especialmente nas áreas de saúde e educação. Em época de dificuldades na economia é justamente quando o povo mais precisa de investimentos, não tendo condições de contratar serviços privados.

Enfim, o objetivo de fato não é superar a crise da economia. O objetivo é criar condições para a geração de superávit primário, exclusivamente para o pagamento dos juros e da dívida pública. A obsessão é tanta que sequer considera a possibilidade, real, de crescimento do PIB ou de aumento da receita corrente líquida.

Os resultados da PEC são previsíveis. Terá um altíssimo custo para a qualidade de vida de nosso povo, interromperá a trajetória de inclusão social e retrocederá no processo de qualificação dos serviços públicos, que já não são suficientes.

Importante atentar, também, para as ausências. Não há menção a medidas que incentivem o crescimento da economia. Não apresenta propostas que aumentem a arrecadação. Só tratam de cortes!

Seria muito interessante que ampliassem o leque de propostas que saíssem do senso comum de sacrifícios dos trabalhadores e serviços públicos.

A taxação das grandes fortunas, por exemplo, que é o único dos 7 impostos federais previstos na Constituição que ainda não foi regulamentado. O economista Amir Khaircalcula que a taxação de patrimônios poderia render aproximadamente 100 bilhões de reais por ano se aplicada, em uma simulação hipotética, sobre valores superiores a um milhão de reais.

Mas, nada disto importa. Para os autores da PEC, o objetivo a ser alcançado é a ampliação de ganhos do sistema financeiro, com a entrega de todas as nossas riquezas. Mesmo que o “ajuste” signifique o sacrifício de nosso povo e a quebra da soberania nacional.

Uma proposta com estas características, por 20 anos, não há como qualificar de outra maneira. É a PEC da perda de uma geração!

 

Tramitação da PEC

CCJC da Câmara para avaliação da admissibilidade

Comissão especial para analisar o mérito

Plenário da Câmara – votação, em dois turnos, onde são necessários 308 votos.

*Técnica-administrativa em educação – Pedagoga na UNB

   Assessora da Senadora Fátima Bezerra


Em: 13 de Agosto de 2016 às 17:17

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